MULHERES NA MINERAÇÃO
Elas já são 20% dos
trabalhadores de No Projeto Serra Pelada e na Serra dos Carajás, mudam o
cenário de lugares onde só homens podiam entrar e contam como enfrentam o dia a
dia em um ambiente tão hostil.
A
rotina é puxada. Para os trabalhadores das minas na região sul do Estado do
Pará, o dia começa antes mesmo de a noite terminar. Às 4h, quando o céu ainda
exibe um tom de azul-escuro profundo, a coordenadora de meio ambiente Euzenir
Porto, 28 anos, já está de pé. Enquanto acorda o marido, o engenheiro mecânico
Antônio Lima, 26, ela passa o café, tinge os lábios com batom e arruma seus
apetrechos para mais um dia de trabalho. Na mochila, o capacete e os abafadores
de ouvido dividem espaço com o estojo de maquiagem e um pequeno travesseiro,
que será usado no trajeto de uma hora entre a Parauapebas, onde mora,
ao Projeto Serra Pelada municipio de Curionopooilis, onde trabalha (Colossus Minerals). No
lugar que ficou mundialmente conhecido por ter abrigado uma das maiores áreas
garimpeiras do planeta, Euzenir representa a verdadeira conquista feminina. Ela
é uma das mais de 130 trabalhadoras contratadas desde 2007 pela mineradora
canadense Colossus, que em parceria com a Cooperativa de Mineração dos
Garimpeiros de Serra Pelada (Coomigasp) conseguiu o direito de explorar
novamente a região.
Se até a década de 1990
a presença das mulheres era proibida entre os mais de 100 mil homens do
garimpo, hoje elas não só circulam como também comandam a implantação da Nova
Serra Pelada. Das funcionárias femininas da Colossus, 10% ocupam cargos de gerência,
assim como Euzenir, que deixou as praias de sua terra natal, em Porto Seguro,
na Bahia, para chefiar 70 homens no monitoramento ambiental do projeto. “Não
sinto preconceito ou insubordinação, mas já me disseram que tenho fama de
brava”, conta, bem-humorada. Atraída pelos altos salários e desafios do setor,
ela chegou a Parauapebas trazendo a mãe e as duas irmãs a tiracolo. Lá,
casou-se com Antônio, teve a filha Letícia, 3 anos, comprou uma casa e um carro
zero, ambos quitados. Agora investe parte dos rendimentos do casal, cerca de R$
13 mil mensais, em uma pós-graduação em mineração, em aulas de inglês e em
pilates, tarefas que ocupam seu pouco tempo livre após a maratona de nove horas
trabalhadas na mina. “É duro, mas faço isso pelo futuro da minha filha”, diz Euzenir.
A participação feminina
entre os trabalhadores da mineração tomou impulso nos últimos dez anos. “As
mulheres sempre estiveram nos garimpos acompanhando seus maridos de forma
ilegal”, conta Claudio Mancuso, presidente da Colossus no Brasil.
“Conforme o setor evoluiu e se profissionalizou, a mão de obra feminina passou
a ser regularizada e requisitada”, diz ele. É uma enorme conquista. Na antiga
Serra Pelada, associava-se a presença das mulheres à prostituição. Agora, elas
formam um contingente qualificado, boa parte com curso superior de geologia e
engenharia. Em cargos de comando, chefiam uma legião de homens, a maioria peões
de obra nas minas de Serra Pelada e de Carajás, também no sul do Pará, onde a Vale
extrai minério graças ao trabalho de mil funcionárias, 13% da força de trabalho
da empresa no local.
Para prosperar no garimpo, muitas têm de enfrentar o preconceito e a
desconfiança masculinas. Tatiane Arouche, 25 anos, supervisora em segurança do
trabalho, deparou-se com os desafios de lidar com os colegas de trabalho homens
logo no início da profissão. Aos 19 anos, ela teve de advertir um peão de obra,
com mais de 30 anos de serviço, que estava sem os equipamentos de segurança. “A
resposta dele foi: ‘Você devia estar brincando de boneca com a minha filha’”,
conta Tatiane. “Na hora senti vontade de chorar, mas me mantive firme e
reforcei a bronca.” Desse dia em diante, a maranhense, reconhecida pela
seriedade com que manda em mais de 500 homens, guardou um conselho do pai,
topógrafo: “Nunca fique sorrindo para peão de obra.” O semblante fechado só é
deixado de lado quando ela fala do noivo, motorista na mina da Colossus. O
casal já mora junto há um ano, mas ela faz questão de dizer que não quer se casar
no papel. “Só uso aliança a pedido dele”, conta, deixando transparecer o
orgulho por sua independência.
A
engenheira elétrica Cristiane Silva, 32 anos, tem outra estratégia para lidar
com seus subordinados do sexo masculino. “Conquisto meus funcionários com
humor, humildade e gentileza”, conta a paraibana de João Pessoa. Com apenas
1,52 m de altura, voz suave e rosto de criança, Cristiane também sabe se impor,
quando acha necessário. “Já tive problemas com um eletricista evangélico, que
não gostava de receber ordens de mulher. Eu disse para ele: ‘Olha, não vou
mudar o meu sexo, então você vai ter que me obedecer’”, diz. As dificuldades de
aceitação entre os gêneros também foram sentidas por Cristiane durante a
faculdade em Campina Grande. Em sua turma, havia apenas sete mulheres e 22
homens. Mesmo que não houvesse discriminação por parte dos colegas, ela testemunhou
de perto o preconceito de um professor. “Ele achava que as mulheres só podiam
se sentar no fundo da sala. Mas eu sentava bem na frente, afinal, era meu Direito
estar ali”, conta.
Mesmo com todos os avanços, a própria legislação reforça o preconceito ao
limitar a participação feminina ao trabalho a céu aberto. Seguindo uma
convenção internacional, um decreto lei de 1938 proíbe que as mulheres atuem no
subterrâneo. Elas só podem desempenhar funções acima do solo, não menos
exigentes e desgastantes. “É uma lei completamente defasada”, lamenta Celaro,
da Colossus. Mas o futuro é promissor. “As mulheres já afirmaram sua
competência no setor de mineração e alguns gestores até preferem trabalhar com
elas por sua determinação e disciplina”, reforça Luciana Magalhães, gerente
regional de recursos humanos da Vale em Carajás. Prova de que nem as funções
mais árduas são um impedimento para a ascensão profissional do chamado sexo frágil.
Fonte: coomigasptocantins1.blogspot.com.br
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